Aprendizagem significativa – breve discussão acerca do conceito
O avanço na compreensão dos mecanismos envolvidos no processo de aprendizagem e a reflexão sobre os desafios impostos pelo mundo contemporâneo indicaram a necessidade de considerar concepções mais sistêmicas e complexas, no que se refere à construção do conhecimento e à formação humana. Nessa direção, os currículos transcenderam à mera seleção dos conteúdos a serem ensinados para instituir princípios que orientassem a intencionalidade do tratamento pedagógico e promovessem a formação de um sujeito capaz de intervir em seu meio social.
Para tanto foi preciso, também, conceber metodologias coerentes com tais proposições, isto é, que superassem a transmissão mecânica de conhecimentos e a formação tecnicista em direção à práxis pedagógica, com vistas à formação de um sujeito ético, reflexivo e humanizado.
Essa formação não é possível sem que os estudantes produzam sentidos e significados acerca de suas aprendizagens, de maneira contextualizada e protagonista, levando em conta o conhecimento prévio que trazem da esfera escolar e para além dela, aspectos que se observam na leitura dos relatos de prática dos professores.
Todavia, vale lembrar que, na transposição didática dos conceitos, há “recontextualizações” inevitáveis, uma vez que a teoria sofre “deformações” em função da própria dinâmica escolar, especialmente no caso das metodologias, dadas as especificidades das áreas do conhecimento, visto que adotam diferentes maneiras de construir e lidar com o conhecimento, não só pela natureza de seus objetos específicos, mas pela visão de sujeito de conhecimento, de verdade e de mundo que cada área carrega.
Além disso, sendo a Educação transversal a outras ciências, como a Psicologia, a Filosofia e a Economia, é esperado que nos apropriemos de certos conceitos de maneira diversa daquela de sua concepção de origem, instituindo uma polissemia que, por vezes, não guarda relação com as proposições neles contidas.
Embora essas adequações conceituais não sejam incomuns, em função da incidência de utilização do conceito aprendizagem significativa nos relatos de prática e nos discursos educacionais de maneira geral, optamos por realizar uma breve discussão sobre esse conceito, na intenção de que a apropriação permita avaliar a pertinência de sua utilização.
Aprendizagem significativa – um conceito cognitivista
A Teoria da Aprendizagem Significativa foi proposta por David Ausubel (1918-2008) em 1963, na obra The Psychology of Meaningful Verbal Learning.
De acordo com Marco Antônio Moreira, a aprendizagem significativa ocorre quando ideias expressas simbolicamente interagem de maneira substantiva e não arbitrária com aquilo que o aprendente já sabe. O autor esclarece que substantiva significa não literal e que não arbitrária indica um conhecimento relevante já existente na estrutura cognitiva do sujeito que aprende, denominado por Ausubel, como subsunçor ou ideia-âncora.
E por que essa aprendizagem é significativa? Porque é esse conhecimento específico, existente na estrutura de conhecimentos do sujeito, que permite dar significado a um novo conhecimento, seja de forma mediada, seja pela própria inferência do sujeito. De acordo com Moreira:
“É importante reiterar que a aprendizagem significativa se caracteriza pela interação entre conhecimentos prévios e conhecimentos novos, e que essa interação é não literal e não arbitrária. Nesse processo, os novos conhecimentos adquirem significado para o sujeito e os conhecimentos prévios adquirem novos significados ou maior estabilidade cognitiva.” (MOREIRA, 2010, p. 2)
Todavia, é importante ressaltar que aprendizagem significativa não quer dizer aprendizagem condizente com o conhecimento formal, validado. Para Ausubel, quando alguém atribui significados a um conhecimento a partir da interação com seus conhecimentos prévios, estabelece a aprendizagem significativa, independentemente de esses significados serem aceitos no contexto do sujeito.
Logo, o fato de o conhecimento prévio ser a variável fundamental para a aprendizagem significativa, tal qual concebida por Ausubel, não garante que seja uma variável facilitadora para a aquisição do conhecimento escolar. Pelo contrário, pode até ser uma variável bloqueadora, caso os significados dos conhecimentos prévios sejam ancorados em conhecimentos e concepções derivadas, por exemplo, do senso comum.
A partir da análise da estrutura cognitiva, Ausubel estabeleceu as seguintes condições para a ocorrência da aprendizagem significativa:
a) o material de aprendizagem deve ser potencialmente significativo;
b) o aprendiz deve ter predisposição para aprender.
O material de aprendizagem é potencialmente significativo, pois a atribuição de significado cabe ao sujeito, logo, não há aula, estratégia ou livro significativo. O material potencialmente significativo é aquele capaz de dialogar, de maneira apropriada e relevante, com o conhecimento prévio do estudante.
Dessa maneira, o material e a mediação são fundamentais, visto que o estudante pode não ter conhecimentos prévios adequados para atribuir os significados aceitos no contexto do componente. Por um lado, essa condição reforça a necessidade da predisposição para aprender, que, como esclarece Marco Antônio Moreira em sua obra, não é uma simples questão de motivação ou identificação com o componente, mas uma predisposição para relacionar-se com novos conhecimentos atribuindo significados. Por outro lado, essa condição convida o docente a acolher as ideias prévias dos estudantes, ainda que sejam insatisfatórias, para, a partir delas, construir situações de aprendizagem capazes de promover a atribuição de significados aos temas tratados.
É por essa negociação de significados que a aprendizagem significativa se diferencia da aprendizagem mecânica. O conhecimento prévio interage com o novo conhecimento, modificando e enriquecendo a estrutura cognitiva prévia, que permite a atribuição de significados ao conhecimento.
Isso não significa dizer que a aprendizagem significativa e a aprendizagem mecânica sejam formas de aprender antagônicas. Para Ausubel, elas são contínuas. Entretanto, outros autores esclarecem que a aprendizagem significativa é mais duradoura, uma vez que na memorização da aprendizagem mecânica, as informações não interagem com o conhecimento prévio e não se ancoram. O conhecimento construído nessa situação só é aplicável a situações conhecidas, isto é, ao significado dado na transmissão do conteúdo.
Retomando e ampliando
- A aprendizagem significativa ocorre quando uma nova ideia se relaciona aos conhecimentos prévios, em uma situação relevante para o estudante, proposta pelo professor. Nesse processo, o estudante amplia e atualiza a informação anterior, atribuindo novos significados a seus conhecimentos.
- As condições para que ocorram a aprendizagem significativa são a adoção de materiais e estratégias potencialmente criativas, por parte do docente, e a predisposição para aprender, por parte do estudante.
- Os conhecimentos prévios e as atribuições de sentido dependem das interações sociais. Nesse sentido, um tema é relevante para o estudante quando sua abordagem não é esvaziada de significado social, mas suas características socioculturais reais são mantidas. A escuta e circulação da palavra, durante a aula, é fundamental para identificação dos significados acerca do tema presentes entre os estudantes.
- Uma abordagem lúdica, ainda que desejável, não garante uma aprendizagem significativa. É necessário promover reflexão e negociação de significados.
- Embora os estudos de Ausubel sejam centrados na dimensão cognitiva, na atualidade, as outras dimensões humanas são consideradas tão relevantes para a aprendizagem quanto a cognitiva.
Saiba mais!
Conheça importantes referências bibliográficas sobre o tema aprendizagem significativa:
AUSUBEL, D. P. Aquisição e retenção de conhecimentos. Lisboa: Plátano Edições Técnicas, 2003.
AUSUBEL, D. P. The Psychology of Meaningful Verbal Learning. New York: Grune & Stratton, 1963.
MOREIRA, M. A. O que é afinal aprendizagem significativa? Revista cultural La Laguna Espanha, 2012. Disponível em: http://moreira.if.ufrgs.br/oqueeafinal.pdf. Acesso em: 22/2/2019.
MOREIRA, M. A. Uma abordagem cognitivista ao ensino da Física. Porto Alegre: Editora da Universidade, 1983.
MOREIRA, M. A.; MASINI, E. A. F. Aprendizagem significativa: a teoria de David Ausubel. São Paulo: Moraes, 1982.
PELIZZARI, A.; KRIEGL, M. L.; BARON, M. P.; FINCK, N. T. L.; DOROCINSKI, S. I. Teoria da aprendizagem significativa segundo Ausubel. Rev. PEC, Curitiba, v. 2, n. 1, p. 37-42, jul. 2001-jul.2002. Disponível em: https://goo.gl/geA25C. Acesso em: 22/2/2019.