(Re)planejar para lidar com dificuldades de aprendizagem identificadas nos alunos

Para os que trabalham em contexto escolar e todos nós que somos agentes educadores, sabemos que vamos vivenciar algumas experiências mais de uma vez. Entra ano e sai ano, vamos nos deparar com felicidades e realizações nossas e de nossos alunos, mas também vamos certamente nos deparar com dificuldades de leitura, escrita, compreensão, interpretação, cálculos e demais aprendizagens de nossos alunos. Nos relatos apresentados, vemos que muitas estratégias de projetos foram criadas, fomentadas, adaptadas e adequadas para suprir de maneira complementar e suplementar as dificuldades apresentadas pelos alunos em sala na hora de construir um conhecimento.

Profissionais da educação não têm a possibilidade de escolher o seu alunado nesta nova realidade diversa e universalizada de acesso escolar. Acontece, então, de receber em sala os diversos alunos que, em sua jornada, também trazem diversos históricos: condições socioeconômicas desfavoráveis, falta de estímulo para o estudo e, ainda, dificuldades decorrentes de situações culturais, biológicas e sensoriais. Todos esses históricos podem ser identificados em algum momento de sua escolarização como uma pessoa com dificuldades de aprendizagem, como relata Willis Santana dos Santos, da Escola Municipal Santa Fé, em Teresina (PI), em seu relato denominado “Apaixonando Leitores”, cujo diagnóstico inicial detectou que muitos alunos chegavam até aquele momento escolar sem conteúdos fundamentais básicos, apresentando dificuldades na leitura e compreensão, muito também por causa das adversidades socioeconômicas que impediam uma melhor estrutura de estudo e aprendizagem para os discentes.

Dificuldades de aprendizagem referem-se a algum prejuízo, atraso e/ou desordem na apreensão de comandos e informações em geral, as quais podem ter as suas origens em fatores diversos, [...] mas não têm toda as suas origens na ordem biológica. Em alguns casos, suas origens podem advir de conflitos pessoais, culturais e sociais.

Dificuldades de aprendizagem referem-se a algum prejuízo, atraso e/ou desordem na apreensão de comandos e informações em geral, as quais podem ter as suas origens em fatores diversos e podem estar ligadas a certos comprometimentos no cérebro, mas não têm todas as suas origens na ordem biológica. Em alguns casos, suas origens podem advir de conflitos pessoais, culturais e sociais. Vale ressaltar que ter dificuldade de aprender não significa que o aluno não aprenda, pois todas as pessoas são capazes de aprender.

Dificuldades de aprendizagem precisam de intervenção na sala de aula e o quanto antes ocorrerem a detecção e a atuação do profissional docente menores serão as lacunas e os efeitos resultantes disso. Pessoas nesta situação podem, com a ajuda da escola, da família e de terapeutas, desenvolver caminhos para lidar com suas debilidades. Conseguir intervir cedo aumenta e melhora a chance de sucesso na escola e, consequentemente, na vida. Se isso não acontecer, além das consequências já esperadas, podem aparecer frustrações, baixa autoestima e outros problemas. 

O professor Willis, já citado, complementa:

“Mais do que transmitir conteúdos, eu precisava fazer com que os pequenos se vissem como pessoas importantes, que despertavam carinho, preocupação, cuidados e desejos de um futuro melhor”.

O aprendizado, objetivo final e alvo principal do direito à educação, às vezes é confundido e trocado por uma palavra muito próxima a ele: o ensino, assim criando um hiato entre ensinar e aprender. A escola há algum tempo se vê como lugar de ensinar, e não lugar de aprender. Perceba que se a escola é lugar de ensinar seu agente principal é o ensinante, o professor, o educador, o funcionário ou a pessoa que esteja na função de transmitir o conhecimento. Porém, se colocarmos o aprender como finalidade, o ator que se destaca não é o formador, mas é o formando, o aluno.

A professora Mychelys de Mattos Queiroz, da Escola Municipal Nossa Senhora do Rosário, em Manaus (AM), no relato intitulado “Escritores Mirins”, após detectar em sua classe dificuldades na produção de textos e na leitura, fomentou a mesma aprendizagem, buscando outros canais de engajamento no conteúdo. Buscou o reconto oral como estratégia de atenção e organização de pensamento, mas também envolveu outros saberes, como artes, geografia e matemática, para suprir as lacunas presentes e fazer com que seus alunos não só assistissem a aula, mas participassem e construíssem o conhecimento almejado e proposto, fazendo com que até os alunos mais receosos pudessem encontrar espaço para se desenvolver nas produções.

Quando focamos no ensino, julgamos erroneamente por ter dificuldades um aluno que não desenvolveu completamente o que foi esperado ou que não correspondeu a toda a nossa expectativa. Porém, posso dizer que muito disso pode ser também “dificuldade de ensinagem”, e isso exige do docente uma mudança de abordagem, de plano e de atitude. Mychelys, sobre si, comenta que:

“O professor teve de se mostrar aberto e afetivo, fazendo de cada aula um momento de reflexão sobre sua prontidão e espaço para que fossem colocados em prática seus conhecimentos prévios. Isso se tornou um exercício de diálogo e de troca de conhecimentos, fazendo com que os alunos se sentissem cada vez mais entusiasmados.”

É aí que entra o planejamento, que acredito ser o primeiro passo para organizar bem as ações pedagógicas do ano. Planejar e arquitetar o processo didático deve fazer parte da rotina da escola e de cada educador para que possam construir juntos e contribuir com estratégias diferentes e diversificadas, a fim de atender às múltiplas necessidades do sujeito e resultar em melhores resultados. Planejar, executar, avaliar e replanejar são constantes do trabalho de escolarização. O (re)planejamento é uma parte importante do gerenciamento da aprendizagem. Com as estratégias de planejamento adequadas pode-se manter o grupo envolvido, organizado e no caminho certo enquanto se ensina, permitindo que você facilite mais a aprendizagem e gerencie menos as discrepâncias de comportamento e conhecimentos, habilidades e atitudes.

(Re)planejar para lidar com dificuldades de aprendizagem identificadas nos alunos é fundamental para o trabalho. No meio do exercício docente ainda somos atropelados pelas situações e perguntas: E se eles não aprenderem? E como incluir esses e outros? E se acontecer uma situação de briga? Ou de desinteresse?

Não existe a receita mágica, mas ter uma boa gestão de aula ajuda a dirimir, prever e superar problemas e dúvidas como essas e outras. Philippe Perrenoud afirma que “Esses dilemas não conseguem ser totalmente superados pela experiência nem pela formação”. 

Para que haja êxito no ensino é necessário que haja uma conversão de vários fatores nesse sentido:

Faça avaliações diagnósticas e recorrentes. Isso vai ajudá-lo a planejar a aula com o tempo e a estratégia certos, que não fiquem lacunas para que surjam outros comportamentos.
Desde o layout da sala até algumas variáveis previstas. Isso o ajudará a estar preparado.
Boa parte do planejamento da sala de aula está no desenvolvimento de planos eficientes. Um bom plano de aula pode incluir um objetivo ou meta, os passos da lição, o resultado esperado e espaço para mudanças ao longo do caminho.
Não deixe que na execução do plano de aula algum aluno se perca ou se distancie do grupo por qualquer motivo que seja. Não permita que alunos estejam longe por não atingirem o conteúdo nem por comportamento de isolamento. Crie uma aula envolvente e um material que pode ser acessado por todos. Com certeza uns precisarão de mais ajuda. Aqueles alunos que são pares mais experientes podem ser transformados em monitores e ajudadores, facilitando a aprendizagem de toda a turma.
É importante que o planejamento da sala de aula tenha regras e consequências definidas. Isso possibilita que os alunos se distraiam menos e se mantenham focados na lição.
A aula estruturada ajuda no foco e diminui agitações e ansiedades. Às vezes, é divertido ser surpreendido e experimentar algo único. Aproveite esses momentos, mas tente fazer isso dentro do contexto da lição, não prejudicando o plano.
Avaliar a aula, o professor e a si mesmo: esse momento não precisa ser um momento sério. Pode ser um momento de entretenimento e gamificação.
Para os alunos que acabam mais rápido ou para uma eventualidade, tenha sempre na manga uma estratégia de envolver a todos e mantê-los focados no projeto.

Em outros tempos, um bom aluno era o que tinha uma autorregulação calibrada para aguentar quatro horas e meia sentado na cadeira, que suportava bem rotinas e repetições de exercícios e aprendia bem pelo estímulo auditivo. Hoje, baseados nas pesquisas das múltiplas inteligências de Howard Gardner, percebemos que temos uma pluralidade de maneiras de ser e de aprender, e isso não denota dificuldades de aprender, mas outras maneiras de aprender. Por isso, se faz tão necessário o exercício contínuo do labor docente, que é planejar, executar, avaliar e replanejar. Essa estratégia permite atingir seus objetivos, personalizar o ensino e gerar impacto positivo na vida escolar dos alunos, preparando-os melhor para a vida.

Saiba mais

Referências bibliográficas:

College Planning for Students with Learning Disabilities. LDonline. Disponível em: http://www.ldonline.org/article/6130/. Acesso em: 26 fev. 2019.

Dificuldade de aprendizagem: além do muro escolar. Faculdade Amadeus. 18 mai. 2016. Disponível em: http://faculdadeamadeus.com.br/graduacao/Web/content/content-anais/encontro-multidisciplinar/attachments/
download/DIFICULDADE%20DE%20APRENDIZAGEM%20alem%20do%20Muro%20Escolar.pdf
. Acesso em: 26 fev. 2019.

GARDNER, Howard. Múltiplas inteligências: a teoria na prática. Artmed,1995.

LA TAILLE, Yves de; OLIVEIRA, Marta Kohl de; DANTAS, Heloysa. Piaget, Vygotsky, Wallon: teorias psicogenéticas em discussão. Summus Editorial, 1992.

VYGOTSKI, L. S. A formação social da mente. 7. ed. São Paulo: Martins Fonte, 2007. (Coleção Psicologia e Pedagogia). Disponível em: http://www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/vygotsky-a-formac3a7c3a3o-social-da-mente.pdf. Acesso em: 28 fev. 2019.

PERRENOUD, Philippe. Ensinar: agir na urgência, decidir na incerteza: saberes e competências em uma profissão complexa. Porto Alegre: Artmed Editora, 2001. 


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