"A BNCC do Ensino Fundamental – Anos Iniciais, ao valorizar as situações lúdicas de aprendizagem, aponta para a necessária articulação com as experiências vivenciadas na Educação Infantil. Tal articulação precisa prever tanto a progressiva sistematização dessas experiências quanto o desenvolvimento, pelos alunos, de novas formas de relação com o mundo, novas possibilidades de ler e formular hipóteses sobre os fenômenos, de testá-las, de refutá-las, de elaborar conclusões, em uma atitude ativa na construção de conhecimentos. Nesse período da vida, as crianças estão vivendo mudanças importantes em seu processo de desenvolvimento que repercutem em suas relações consigo mesmas, com os outros e com o mundo." (BNCC, 2018, p. 58)

Podcast

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Minha escola faz a diferença no trânsito: eu faço a minha escolha

Esta prática teve como objetivo conscientizar os alunos para que se tornassem agentes multiplicadores de ações educativas e escolhas positivas no trânsito em seu convívio social.

Componente(s) curricular(es) envolvido(s):

Língua Portuguesa.

Quando:

O projeto não tem data específica para ser realizado.

Habilidades trabalhadas:

EF35LP01; EF35LP03; EF05LP09; EF03LP13; EF04LP14; EF35LP15; EF35LP17; EF03LP24; EF35LP21.

Escola:

Escola Estadual Professor Leon Renault, Belo Horizonte (MG).

Professor(a) responsável:

Eliane Silvestre Oliveira.

O que é:

A proposta foi realizada com 64 alunos do 5º ano do Ensino Fundamental – Anos Iniciais numa escola pública de Belo Horizonte localizada em área de tráfego intenso. A proposta surgiu devido ao grande desrespeito às regras de trânsito no local de embarque e desembarque dos alunos.

Apesar de haver uma via transversal para a entrada de vans e carros de passeio, tínhamos um trânsito caótico nos arredores da escola.

Dessa forma, em 2017, escolhi o trânsito como tema de estudo, por conta de sua proximidade com o dia a dia dos alunos. Como proposta do projeto, planejei ações voltadas à construção do conhecimento de forma interdisciplinar e transversal.

Num primeiro momento, pensei em ações envolvendo os conteúdos da disciplina Ensino Religioso, partindo do pressuposto de que trânsito se relaciona com a cidadania, a responsabilidade social e a inclusão, temas importantes na formação de valores de cada indivíduo.

No que diz respeito à disciplina de Língua Portuguesa, optei por trabalhar os gêneros textuais "Relato de experiência", "Ficção Cientifica", "Carta", "Notícia" e, por último, "Jornal".

Nas discussões, nas produções de texto e nos trabalhos, houve engajamento, interesse e dedicação dos alunos.

O objetivo geral do projeto foi alcançado, já que muitos alunos comentaram que os conhecimentos sobre trânsito haviam chegado até suas famílias. Nas discussões, nas produções de texto e nos trabalhos, houve engajamento, interesse e dedicação dos alunos.

Isso representou um ganho de autonomia para os alunos, que aprenderam a argumentar e a tomar decisões amparados num conhecimento construído a partir do desenvolvimento do projeto.

A partir do estudo do tema, muitos alunos se tornaram multiplicadores de informação em suas famílias e perante outros colegas da escola.

Acredito que esses jovens serão protagonistas e participativos no decorrer dos próximos anos letivos, bem como sujeitos ativos na resolução de problemas na escola, na família no trabalho e até no trânsito.

Além disso, a partir do projeto, os alunos adquiriram o gosto pela leitura e pela escrita.

Como fazer:

Durante a minha trajetória profissional, atuei como educadora de trânsito. No trabalho, ficava incomodada quando ouvia de um candidato à obtenção da carteira de habilitação a afirmação de que não estava ali para aprender sobre educação no trânsito, mas, sim, para conseguir o tão sonhado documento.

Ao cursar Pedagogia, direcionei minha pesquisa para as formas de aplicação da educação para o trânsito em sala de aula, uma vez que o Código de Trânsito Brasileiro prevê que este conteúdo seja trabalhado da Educação Infantil até o Ensino Médio.

Isso aparece referendado, por exemplo, nas Diretrizes Nacionais da Educação para o Trânsito no Ensino Fundamental e nos Parâmetros Curriculares Nacionais.

Além disso, diante de estatísticas dando conta de que os acidentes de trânsito são a maior causa de morte de jovens de 10 a 19 anos, tornava-se urgente a abordagem na escola do tema "Trânsito", visando conscientizar crianças e adolescentes.

Logo que assumi como professora duas turmas do 5º ano, em 2017, comecei a elaborar um projeto-piloto sobre educação para o trânsito. Ele incluía as seguintes ações:

  • Apresentação do projeto em aula expositiva e realização de um trabalho individual escrito.
  • Realização da campanha “Maio Amarelo na Escola”.
  • Leitura e interpretação do livro "As três Cidades", de Ronaldo Simões Coelho, culminando com a produção de cartaz e exposição em mural.
  • Visita à Instituição Educativa Transitolândia, para uma vivência lúdica sobre o tema.
  • Leitura e interpretação dos livros da coleção "Viva o Trânsito", e elaboração de trabalho em grupo e de um livro.
  • Criação de uma hashtag sobre o trânsito, além de aula expositiva e trabalho individual escrito.
  • Criação de um jornal mural, com aula expositiva, trabalho individual e trabalho em grupo.
  • Apresentação de Flash Mob na "Semana Nacional do Trânsito".

Como base da metodologia de trabalho, apoiei-me na teoria sociointeracionista de Lev Vygotsky, que diz que o desenvolvimento do indivíduo acontece a partir do processo sociohistórico e cultural. Esse desenvolvimento está intimamente relacionado com o contexto no qual a pessoa está inserida.

Dessa forma, busquei favorecer a interação entre os alunos, adotando práticas de trabalho colaborativo. Por fim, pensei numa didática que abrangesse a interdisciplinaridade.

Para a definição das estratégias, levei em consideração que os alunos têm inteligências múltiplas, com habilidades diferenciadas para atividades distintas.

Dessa forma, alguns alunos podem apresentar mais de um tipo de inteligência e, consequentemente, uma ou várias habilidades, que devem ser despertadas pelo educador por meio de estratégias diferenciadas de ensino.

Ao definir as estratégias, optei por contemplar também a utilização de atividades que atendessem aos diferentes estilos de aprendizagem e às inteligências múltiplas.

Comecei pela apresentação do projeto. Iniciei a abordagem do tema, a partir da disciplina de Ensino Religioso, com uma roda de conversa sobre conceitos de trânsito, meios de locomoção, comunicação e convívio social, entre outros assuntos.

Sugeri que os alunos fizessem o primeiro trabalho escrito, seguindo um roteiro de conteúdos que incluía, por exemplo, a história do trânsito no Brasil, dos meios de transportes, a origem das profissões ligadas ao trânsito.

Os alunos foram incentivados também a buscar uma música que falasse sobre o trânsito e a assistir no Youtube ao vídeo "Pateta no Trânsito". Um resumo deveria ser escrito sobre a animação da Disney, com uma nova versão, criada pelos alunos.

A grande maioria fez o trabalho e o entregou dentro do prazo estipulado. Na sequência, os alunos apresentaram suas pesquisas para os colegas, atraindo interesse, inclusive, daqueles que não haviam feito a pesquisa.

A falta de capricho apareceu em alguns casos, com alunos entregando trabalhos sem nenhuma estruturação de capa, margem etc.

Para alunos do 5º ano, isso é um fator preocupante, pelo fato de estarem próximos do encerramento do nível de Ensino Fundamental – Anos Iniciais.

A apresentação das letras das músicas foi bem divertida. Surgiram várias letras diferentes e inesperadas abordando o tema "Trânsito".

A história "Pateta no Trânsito" foi vista em casa, em vários casos com a participação dos pais.

Para a ação seguinte, aproveitei a ocorrência do "Maio Amarelo", movimento internacional que busca chamar a atenção da sociedade para o alto índice de mortos e feridos no trânsito. Sob essa inspiração, criei a campanha "Maio Amarelo na Escola", com o objetivo de fomentar o protagonismo dos alunos em ações educativas no trânsito, enriquecendo suas vivências, a convivência e a cidadania.

A campanha foi apresentada numa roda de conversa, em classe, e, depois, para toda a comunidade escolar. Aproveitamos para destacar o tema de 2017: "Minha Escolha faz a Diferença".

Produzimos um informativo sobre o movimento, os alunos fizeram lacinhos de cetim na cor amarela e criamos um porta-documentos, a partir da doação de um parceiro.

Formamos grupos de três alunos cada que visitassem as demais salas de aula para entregarem o kit de brindes, explicarem o informativo e convidarem os professores para participarem do "Movimento Amarelo". Os alunos visitaram também as salas da Secretaria, da Supervisão e da Direção da escola.

Os demais alunos da turma ficaram na sala de aula, realizando tarefas da cartilha "Trânsito Legal", que reúne jogos, dicas e passatempos educativos.

A ação foi um sucesso, os profissionais da escola ficaram encantados com a desenvoltura dos alunos, que, por sua vez, viram na iniciativa uma oportunidade para o exercício do protagonismo. Segundo um participante, aquele foi seu melhor dia na escola. Outro contou que convidou a diretora para participar do Movimento, e ela aceitou.

Propus, então, que todos produzissem um relato escrito sobre o tema e sobre as experiências vividas. A adesão foi enorme, com textos fantásticos. Nada mau para uma turma que sempre reclamavam das atividades textuais. Tudo ficou mais fácil porque eles já haviam estudado a produção de relatos na disciplina de Língua Portuguesa

Como atividade de encerramento, fiz uma fotografia panorâmica com os alunos usando camisetas brancas e o lacinho amarelo e com letras formando as palavras "Maio" e "Amarelo".

A ação foi um grande sucesso, com a participação efetiva de 100% dos alunos das duas turmas. Todos se sentiram importantes e capazes de promover mudanças e exercer a cidadania.

A terceira ação teve dois momentos importantes. Um deles foi a exibição do curta-metragem de animação "A Ilha", que retrata a realidade e as dificuldades vividas por um pedestre diante do crescimento da frota de veículos em sua cidade. Outra iniciativa foi a leitura do livro "As Três Cidades", de Ronaldo Simões Coelho.

A obra aborda, de forma criativa e bem ilustrada, três cidades imaginárias que vivenciam situações diferentes na comparação rotina real do trânsito. Por meio das histórias, o autor buscou criar uma harmonia entre os usuários do trânsito.

Cada aluno levou para casa um exemplar do livro, graças à doação de um parceiro. A iniciativa visou também estimular o interesse dos jovens pelo mundo da leitura.

Com base nas histórias, os estudantes foram convidados a produzir um texto sobre como seriam suas cidades ideais.

A proposta foi recebida com muita alegria e grandes ideias, atraindo a totalidade dos alunos.

Ainda com base no livro sobre as três cidades, os estudantes tiveram de criar desenhos em cartolina para suas cidades imaginárias. Novamente, o trabalho teve 100% de adesão. O encerramento dessa atividade se daria no mês seguinte, em julho, com uma exposição, na forma de mural, e aberta às outras turmas. Os alunos ficaram encantados e curiosos para ler cada história e conhecer as várias cidades que foram criadas.

Ainda no mês de junho, visitamos o espaço educativo "Transitolândia". Trata-se de uma minicidade com espaços delimitados para a circulação de veículos e pedestres, como avenidas com faixas pintadas, semáforos, posto de gasolina, ônibus e cruzamentos de vias.

A visita propiciou aos alunos uma vivência lúdica em relação às regras de trânsito. Todos foram muito participativos no momento das perguntas e das dinâmicas. Durante o passeio de bicicletas, procuraram cumprir as regras aprendidas.

Após a visita, propus a escrita do gênero carta que havíamos estudado no decorrer da semana. A proposta foi utilizada como forma de enriquecimento da cidadania e da convivência. Todos os alunos participantes escreveram as cartas em agradecimento, ressaltando a forma como foram recebidos e o que mais gostaram na visita.

Os alunos que não conseguiram cumprir as regras de circulação foram "multados", ficando sem circular por algum tempo, conforme havia sido combinado previamente.

Nos dias posteriores à visita, ouvi de muitos alunos que, quando chegaram em casa, passaram os principais ensinamentos às famílias.

Representantes da Instituição foram convidados a realizarem uma palestra na escola destinada aos demais estudantes. O evento atraiu 360 alunos, a totalidade das turmas do Ensino Fundamental – Anos Iniciais.

Para os alunos que conheceram a "Transitolândia", pedi que escrevessem uma carta de agradecimento aos monitores.

Tais cartas seriam colocadas numa caixa chamada "Maleta do Agradecimento". Depois da correção dos textos, as cartas foram lacradas e colocadas na maleta.

Dois alunos foram sorteados para entregar a maleta à instituição.

Na sequência do projeto, fizemos a leitura e a interpretação dos livros da coleção Viva o Trânsito, editados pelo Departamento Nacional de Trânsito (Denatran).

As obras abordavam temas como trabalho infantil, a história dos meios de transporte, sinalização viária, modelo de cidade ideal, a rotina de um entregador no trânsito, engarrafamentos e o trabalho de vendedores ambulantes.

Cada aluno recebeu aleatoriamente um livro da coleção. Após as leituras, dividi a turma em grupos para que realizassem, de forma coletiva, as atividades dos livros. Dessa forma, cada aluno do grupo ficou incumbido da realização e discussão de uma atividade.

Mais à frente, tendo como referência os personagens principais dos livros lidos, os alunos foram estimulados a produzirem uma obra de ficção (livro ou história em quadrinhos). Cada um deveria criar um final diferente daquele dado ao livro original.

Desta vez, a adesão foi menor, por conta da dificuldade do trabalho. Dos 64 alunos participantes, 54 conseguiram realizar o trabalho. Após a entrega, fizemos uma manhã de leitura e troca de livros.

A proposta seguinte de trabalho foi a criação de hashtags sobre trânsito, inspiração vinda da campanha "Maio Amarelo" que, em 2017, teve a ela associada a hashtag "#MinhaEscolhaFazADiferença".

Os alunos ficaram empolgados com a ideia, que tinha também como atributo estimular o raciocínio, a linguagem escrita e a atenção, promovendo a interpretação de situações cotidianas e a criação de novas situações. A adesão foi de 100% dos alunos.

Os jovens partiram em agosto para a criação de um jornal mural com o tema "Chega de Acidentes". Ação visou estimular o raciocínio, a linguagem escrita e a atenção, além de incentivar a crítica e a solução de problemas.

Após discussão sobre as áreas que compõem um jornal, pesquisamos informações sobre trânsito em veículos impressos e eletrônicos.

Fizemos uma leitura coletiva de manchetes, para que cada aluno apresentasse sua compreensão sobre as notícias. Chamou a atenção o número de notícias sobre acidentes graves, com muitas vítimas. Os alunos demonstraram indignação com tanta violência no trânsito.

Após discussões sobre o alto índice de acidentes no Brasil e em nosso Estado, foi proposto um exercício para amenizar o que as manchetes traziam.

Cada aluno deveria criar a sua própria manchete ou notícia do dia e fazer com que ela relatasse um fato, ação ou situação positiva no trânsito. Todos os alunos se dedicaram à proposta, apontando situações bem positivas envolvendo pedestres, motoristas, veículos, agentes de trânsito, vias e inclusão de pessoas com deficiência.

O jornal mural foi exposto com as manchetes positivas dos alunos no lado externo da sala. As notícias sobre acidentes de trânsito também foram expostas, mas com uma tarja vermelha onda estava escrita a frase "Chega de Acidentes!".

Os estudantes receberam colegas de outras turmas e explicaram o objetivo do trabalho.

Percebi naquele momento que alunos, inicialmente, sem interesse pela leitura e pela escrita, haviam se tornado jovens críticos e capazes de apontar soluções para problemas do dia a dia.

A última ação do projeto aconteceu em setembro, por ocasião da Semana Nacional do Trânsito. Foi um flash mob, uma aglomeração instantânea de pessoas num determinado lugar para execução de uma encenação inusitada e previamente combinada.

Escolhemos dança. Os alunos foram divididos em cinco grupos, com cinco coreografias diferentes. Os grupos foram dispersos no meio do público na escola. A cada mudança de música, em intervalos curtos, iniciava-se uma nova coreografia.

Como alguns alunos não queriam dançar, sugeri que criassem um cartaz com folhas de ofício. Ao final da apresentação de dança, esses alunos se voltaram para o público formando a seguinte frase: "18 a 25 de Setembro – Semana Nacional do Trânsito – Minha Escolha Faz Diferença".

Foi um dos momentos mais gratificantes do projeto, pois a apresentação trouxe uma proposta de encerramento inovadora e informativa para toda a comunidade escolar. O resultado foi tão positivo que os alunos receberam convites para a repetir a apresentação na abertura das Olimpíadas da escola e no evento "Virada da Educação", com a presença de pais e do público em geral.

Entendo que os objetivos específicos traçados para o projeto foram alcançados quase que em sua totalidade – no desenvolvimento do tema, na vinculação da proposta com a realidade dos alunos, na diversidade de atividades desenvolvidas.

Aqueles alunos que apresentavam maior dificuldade na leitura e na escrita venceram grande parte de suas dificuldades e ganharam autonomia. Foram, em linhas gerais, os que mais se dedicaram.

Quanto ao objetivo geral do projeto – conscientizar os estudantes para que se tornassem agentes multiplicadores de escolhas positivas no trânsito – entendo que este ele foi igualmente alcançado.

Muitos alunos comentaram que repassaram para as famílias muitos conhecimentos adquiridos.

A partir do estudo do tema, os jovens se tornaram, de fato, multiplicadores. Acredito que eles serão protagonistas e participativos no decorrer dos próximos anos letivos.

E outro grande resultado obtido foi que os alunos tomaram gosto pela leitura e pela escrita.

O maior resultado do projeto, acredito, foi ver a educação com outros olhos. Foi ver que um trabalho organizado, orientado e articulado pode fazer com que alunos da escola pública tenham prazer no estudo.

Ficou evidente também que articular um projeto não demanda mais trabalho, como ouvimos relatos de muitos professores, mas sim novas possibilidades.

Acredito que, com esse projeto, venci o maior desafio de todos, o de despertar o interesse dos alunos, conduzindo o ano letivo sempre com desafios e a presença do novo.

Saiba mais

Conheça algumas referências bibliográficas usadas nesse trabalho: