"A BNCC do Ensino Fundamental – Anos Iniciais, ao valorizar as situações lúdicas de aprendizagem, aponta para a necessária articulação com as experiências vivenciadas na Educação Infantil. Tal articulação precisa prever tanto a progressiva sistematização dessas experiências quanto o desenvolvimento, pelos alunos, de novas formas de relação com o mundo, novas possibilidades de ler e formular hipóteses sobre os fenômenos, de testá-las, de refutá-las, de elaborar conclusões, em uma atitude ativa na construção de conhecimentos. Nesse período da vida, as crianças estão vivendo mudanças importantes em seu processo de desenvolvimento que repercutem em suas relações consigo mesmas, com os outros e com o mundo." (BNCC, 2018, p. 58)

Podcast

Ouça o podcast sobre os Anos Iniciais do Ensino Fundamental.


Juntos pela paz: é tempo de semear

Área(s): Linguagens.

Esta prática se propôs a desenvolver valores relativos à paz e a não violência, despertando nos alunos o desejo de serem semeadores da paz por meio de diversos gêneros textuais e discursivos.

Componente(s) curricular(es) envolvido(s):

Língua Portuguesa.

Quando:

A qualquer momento do ano letivo.

Materiais:

Não foram indicados.

Habilidades trabalhadas:

EF05LP16; EF03LP20; EF35LP15; EF04LP19; EF35LP17; EF04LP21; EF05LP24; EF35LP18; EF35LP20

Professor(a) responsável:

Patricia Regina Wanderlinde Alves.

Escola:

EB Professora Judith Duarte de Oliveira, Itajaí (SC).

O que é:

Todos nós queremos alcançar a paz. Desejamos ter paz interna, interpessoal, no trabalho, em nossas famílias e comunidades.

Mas, para que isso aconteça, a paz precisa se tornar mais do que apenas uma palavra. Foi acreditando nisso que desenvolvi um projeto para motivar as futuras gerações a construírem um mundo mais solidário e sustentável, onde encontraremos respeito, segurança e dignidade para todos.

Tudo começou no início de 2017, enquanto eu realizava uma roda de leitura com os alunos do 5º ano. Um fato chamou a atenção de todos: um aluno havia trazido um texto jornalístico que falava sobre a morte de um idoso numa discussão de trânsito.

Os alunos manifestaram indignação e revolta em relação ao caso e por várias outras manifestações de violência que estavam acontecendo na escola, na comunidade, no município e em outros lugares.

Eles questionaram sobre como poderíamos contribuir para promover uma mudança na situação que estávamos vivendo. Foi nesse contexto que surgiu o projeto "Juntos pela Paz: é tempo de semear".

O projeto, iniciado com os alunos do 5º ano e ampliado para os demais alunos da escola, buscou desenvolver valores relativos à paz e à não violência por meio de experiências significativas, pois, em tempos de tantas guerras, conflitos e intolerância, nada melhor do que despertar nas pessoas o desejo de se tornarem semeadoras da paz.

Ao selecionar as atividades, procurei resgatar o saber do educando e contextualizar os conteúdos com as suas vivências e realidade, não deixando de analisar, criticamente, cada uma delas, tanto em relação à aprendizagem, quanto em relação à construção de valores, como respeito, amor e amizade.

À medida que as atividades foram sendo desenvolvidas, houve uma melhora significativa na aprendizagem e uma mudança no modo como os alunos analisavam tudo à sua volta.

Eles começaram a ser mais parceiros da escola, sinalizando problemas que observavam no ambiente escolar e sugerindo ações para o despertar de atitudes pacíficas, solidárias e contra o bullying.

Além disso, houve um grande envolvimento de famílias, empresários, comunidade e meios de comunicação.

Verifiquei também que, por meio do diálogo e da investigação, os alunos se envolveram numa trajetória de aprendizado compartilhado, assumindo a responsabilidade pelo próprio crescimento.

Isso ficou evidenciado na confecção de livros, audiolivros e aplicativos sobre cinco pacificadores que fizeram diferença e deixaram a sua marca na história e, principalmente, na produção de um informativo escolar, com tiragem mensal de 3 mil exemplares.

Como fazer:

Sendo conhecedora da importância de haver na escola um espaço adequado para a realização de leitura, criei um cantinho na minha sala onde os alunos interagem com diversos materiais e gêneros textuais. Neste espaço, busquei organizar estratégias que favorecessem a interação entre língua e linguagem nas diferentes situações de leitura.

Dentre elas, a organização de rodas de leitura diárias ou semanais, com aproximadamente 30 minutos de duração, buscando desenvolver, nesses momentos, habilidades de leitura.

O espaço tem um sofá, almofadas, tapete, estantes e livros variados, sendo que tudo está disponível aos alunos no momento em que eles quiserem, nas rodas de leitura, no recreio ou quando estiverem ociosos após o fim das atividades.

Foi justamente num momento de análise de um texto jornalístico que os alunos se motivaram para promover uma mudança na situação de violência e de falta de respeito.

Após conhecer a concepção dos alunos, na realização do diagnóstico, senti a necessidade de despertar neles o desejo de se tornarem participantes ativos do projeto, interagindo e contribuindo com sugestões. Aproveitei a oportunidade e fiz a leitura e a interpretação oral do conto O Jovem e as Estrelas do Mar. O texto mostra um exemplo de como, com pequenas atitudes, podemos fazer a diferença onde quer que estejamos.

Os alunos compreenderam a mensagem. O que, no início, era uma simples ideia de fazer uma pesquisa sobre a cultura da paz, refletir sobre ela, conhecer suas características e identificar suas influências, tornou-se um grande desafio, pois o interesse dos alunos aumentou e novas ideias foram surgindo.

Dando sequência ao projeto, fizemos a leitura e interpretação de um pequeno texto e da música A Paz, do grupo Roupa Nova. Após cantarem várias vezes a música, os alunos foram divididos em equipes para que representassem cada estrofe com desenhos. Com as ilustrações concluídas, fariam uma apresentação para os demais grupos.

Foram realizados, também, atividades de interpretação escrita da música e o "Jogo dos Sete Erros", bem como um estudo da Declaração e Programa de Ação Sobre uma Cultura de Paz, da Assembleia Geral da ONU.

Comecei também a enviar, semanalmente, uma frase de Martin Luther King e Mahatma Gandhi para os alunos lerem em casa e discutirem com seus pais.

Sempre no dia seguinte ao envio das frases, discutia com a turma sobre a reflexão realizada em família.

Dando continuidade às atividades, utilizei um projetor para apresentar aos alunos a obra Guerra e Paz, do pintor brasileiro Candido Portinari.  

Já com algum conhecimento sobre a cultura de paz, os alunos escreveram uma poesia. Fiquei feliz com o resultado, pois, de modo geral, a escrita refletiu os novos conhecimentos, inclusive daqueles que estão em processo de alfabetização.

Usando um projetor, apresentei para os alunos o clipe oficial da música Heal the World ("Cure o Mundo"), do cantor Michael Jackson. Após o vídeo, entreguei a letra da música em inglês, com a tradução.

Fizemos a leitura e a interpretação oral da canção, fazendo uma comparação com a versão "A Paz", do grupo Roupa Nova.

Os alunos perceberam as semelhanças e as diferenças entre as duas versões. Identificaram que a essência das duas era a mesma.

Como os alunos tinham diferentes níveis de conhecimento, procurei diversificar os desafios.  

Por isso, comecei a fazer a leitura compartilhada do livro O Pequeno Príncipe, de Antoine de Saint-Exupéry. Todos os dias, antes do início das atividades, eu lia para os alunos alguns capítulos. É importante ler para os alunos, mesmo que eles já saibam fazer isso sozinhos, pois continua sendo um prazer para a criança.

Vale a pena destacar, também, a importância da leitura compartilhada para a formação de leitores.

Enquanto fazíamos a leitura do livro, realizamos reflexões bastante significativas, inclusive sobre bullying. Isso me levou a pesquisar e a organizar uma série de atividades a partir de um dos capítulos que os alunos mais haviam apreciado: "O Diálogo do Príncipe e a Raposa".

Os alunos também realizaram entrevistas sobre amizade com pessoas de seu relacionamento.

Enquanto fazíamos a leitura do livro, realizamos reflexões bastante significativas, inclusive sobre bullying. Isso me levou a pesquisar e a organizar uma série de atividades a partir de um dos capítulos que os alunos mais haviam apreciado: "O Diálogo do Príncipe e a Raposa".

Os alunos também realizaram entrevistas sobre amizade com pessoas de seu relacionamento.

A partir disso, foi retomada uma frase de O Pequeno Príncipe: "O essencial é invisível aos olhos". Reforcei que essa atitude dos alunos era essencial para ajudar a construir uma vida melhor e mais digna para todos.

Além de acompanhar as dificuldades e os avanços de cada aluno em todos os momentos do trabalho, fazendo a análise de produções, comentários, descobertas e dúvidas, senti a necessidade de ampliar ainda mais o projeto.

Para isso, iniciei a confecção de livros sobre pacificadores que deixaram a sua marca no mundo. Levei os alunos ao laboratório de informática para que pesquisassem e conhecessem alguns pacificadores.

Depois de nomes terem sido listados, os alunos fizeram a escolha de cinco para conhecerem melhor: Martin Luther King, Mahatma Gandhi, Nelson Mandela, Madre Teresa de Calcutá e Anne Frank. A turma foi dividida em cinco equipes.

Após a pesquisa, entreguei para cada grupo um bloco de papel e expliquei como montar um livro. Também orientei o passo a passo de como deveriam escrevê-lo: capa, contracapa, folha de rosto, introdução, referências.

Após terem concluído a história dos pacificadores, solicitei que elaborassem uma seleção de frases conhecidas e criassem um quiz, com dez perguntas e respostas sobre os personagens para que também fossem incluídos no livro.

Depois dos rascunhos prontos, os alunos digitaram os textos no laboratório de informática e eu os ajudei na escolha das imagens.

Levei para um técnico em computação realizar a arte e imprimir os livros, que hoje fazem parte da "Coleção Semeadores da Paz".

Além da produção escrita dos livros, questionei os alunos sobre como levar o conhecimento daqueles pacificadores para as pessoas que não sabiam ler ou que tinham algum problema de visão.

Foi aí que surgiu uma grande inquietação: como aproximar as pessoas daquelas histórias tão inspiradoras? Como proporcionar o encantamento pela leitura com tamanhas dificuldades?

Resolvemos, então, produzir, junto com os livros impressos, audiolivros das histórias, todas lidas pelos alunos e gravadas em CDs.

Nossa produção foi apresentada na exposição “Leitura na Qualidade de Vida”, que foi organizada pela escola para abrigar os trabalhos realizados por todas as turmas.

Depois da exposição, fui convidada para apresentar o projeto no Conselho de Classe da escola, a fim de mobilizar os professores para que também trabalhassem com a temática.

Consegui o apoio do professor do laboratório de informática, que topou fazer um aplicativo com a “Coleção Semeadores da Paz”. Hoje, o app tem todos os livros digitais com áudios, frases, imagens e o quiz.

Em parceria com os alunos do 4º ano, do qual eu também era professora, foram realizadas pesquisas, em casa e no laboratório de informática, sobre curiosidades do meio ambiente.

Foram selecionadas as melhores informações para o painel "Você Sabia? S.O.S. PlanetaTerra", contendo perguntas e respostas sobre temas ambientais como poluição, água e lixo.

Antes de montar o painel, escaneei todas as ilustrações que formariam um livro com o mesmo nome. A obra também foi apresentada na exposição "Leitura na Qualidade de Vida".

Conforme as atividades foram sendo desenvolvidas, senti a necessidade de organizar um espaço na biblioteca escolar sobre cultura de paz.

Solicitei doações a diversos órgãos e entidades que desenvolvem projetos humanitários, como a Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (Unesco), que enviou diversos livros e materiais informativos.

Um caso de racismo contra duas professoras negras de uma escola de Minas Gerais chamou a nossa atenção. Fiquei impressionada com a reação dos alunos após conhecerem a notícia sobre o episódio.

Houve muita indignação. Uma aluna fez um comentário alegando que o “Esquadrão da Paz” tinha que ir conversar com essas professoras para dizer que elas são importantes e que não deveriam ficar tristes.

Eu achei a fala muito interessante. Disse à turma que não tínhamos como ir até lá, mas que poderíamos enviar nossas palavras. Sugeri que escrevessem uma mensagem para elas e fizessem um desenho. Montaríamos uma carta gigante e a enviaríamos pelo correio. Todos amaram a ideia.

A turma do 4º ano também participou da atividade. Nela, busquei resgatar valores de compaixão e solidariedade.

Depois de alguns dias, a professora para qual enviamos a carta gigante compartilhou no meu Facebook uma mensagem de agradecimento pelo apoio, com fotos e vídeo. Dezenas de pessoas amigas delas também escreveram mensagens para mim e para meus alunos. Essa foi mais uma experiência gratificante.

Na sequência, criamos um logo para uso num evento em comemoração ao Dia Internacional da Paz, em 21 de setembro.

Também escolhemos a música Sou da Paz, do grupo Cia. Tribo de Dança. Disse aos alunos que ela seria ensaiada para uma apresentação de dança. A maioria dos alunos disse que seria algo muito difícil de ser feito.

Além de participarem do projeto "Juntos pela Paz", desenvolvido na escola, os alunos também atuaram no projeto internacional de arte e alfabetização Pinwheels for Peace (Cata-ventos pela Paz).

A crianças "plantaram" cata-ventos com mensagens de paz nos jardins de nossa cidade. Nós confeccionamos mil exemplares. Contamos com a ajuda de todos os alunos da escola.

Além disso, foram realizadas apresentações artísticas sobre a temática, declamação de poesias, distribuição de folhetos com frases dos pacificadores pesquisados, distribuição de balões brancos a gás, pinturas no rosto e distribuição de mudas de árvores frutíferas.

Paralelamente ao evento, nossa escola fez reflexões sobre a paz e um minuto de silêncio em seu favor. Em seguida, foi realizado um abraço coletivo em prol da paz no mundo. O evento foi um sucesso e teve uma grande divulgação na imprensa.

Conforme o tempo foi passando, novas alegrias foram surgindo com o projeto. Fui a primeira colocada na categoria Ensino Fundamental, no "Prêmio Mérito Educacional – Boas Práticas em Educação", promovido pela Rede Municipal de Ensino de Itajaí.

Tive também a oportunidade de compartilhar informações sobre o projeto com educadores de outras nações, participando da "II International Conference Peace Education For Peacebuilding ("2ª Conferência Internacional Educação de Paz para a Construção da Paz"), que ocorreu em dezembro de 2017, na Armênia.

Com tudo o que foi desenvolvido e vivenciado, percebi que o projeto não poderia ser finalizado em 2017. Por isso, teve continuidade em 2018, com o envolvimento de toda a escola. Em sua nova fase, ganhou o nome de "Leitura na Qualidade de Vida: Ciranda pela Paz".

Em abril de 2018, aproveitando a proximidade do Dia Nacional do Livro Infantil (18 de abril), organizei, com os alunos do 5º ano, a feira de troca "Ciranda do Livro". A ideia era aproveitar um livro que já tinha sua história conhecida pelos alunos e trocá-lo por outro e, assim, as histórias transitariam entre as crianças e suas famílias. 

Essa troca, além de incentivar a leitura como fonte de conhecimento, prazer e entretenimento, ajudou os alunos a aprenderem a importância de compartilhar e reaproveitar.

Para a realização dessa feira, eu, junto com alguns alunos, passei em todas as turmas da escola, do pré ao 9º ano, solicitando que trouxessem livros de literatura para troca. Todos os dias, eu passava nas salas de aula para recolher os livros e entregava uma ficha para cada exemplar entregue, para que fosse trocada por outro livro no dia da feira.

Conversei com a coordenadora da creche CEI Nilton de Andrade, que fica localizada próxima da escola, para que também participasse da feira com seus alunos. Após duas semanas de coleta, foram arrecadados 1.177 livros.

No dia da feira de troca, foi organizado um espaço no pátio da escola. Em parceria com a professora de Língua Portuguesa, os alunos do 8º e 9º anos apresentaram peças teatrais de histórias da literatura infantil e de Monteiro Lobato.

No início de 2018, também concretizei um sonho acalentado havia muito tempo: a criação do "Informativo Semeadores da Paz".

A ideia havia surgido da observação de notícias negativas na mídia – crimes, corrupção, drogas, falsificação, abusos, bullying, dentre outras. A violência se tornou comum e aceita como parte de nossa sociedade, e, para alguns, é um modo de vida. 

A geração dos nossos alunos, dos nossos filhos está crescendo acreditando que o mundo é só isso. Eles não têm referências e inspirações boas como exemplo. Precisam saber que, para cada pessoa que faz o mal, existem milhares que fazem o bem e que suas histórias não são compartilhadas.

Com tiragem mensal de 3 mil exemplares, com 12 páginas, e também no formato digital, o "Informativo Semeadores da Paz" aborda diversas temáticas nas seções "Qualidade de Vida", "Saúde", "Espaço Família", "Ecologia", "Sustentabilidade", "Entrevistas com Pessoas Inspiradoras", "Viajando na História com Pacificadores" e "Notícias da ONU".

Além disso, busca valorizar e estimular a leitura e a produção textual dos alunos, oportunizando melhoria da qualidade da leitura e escrita através da divulgação impressa, acessível a toda a comunidade, e por meio da divulgação on-line.

Para apoiar essa missão, consegui estabelecer parcerias com empresários. Na criação do informativo, visitamos as dependências de um jornal do município, onde os alunos acompanharam todas as etapas de execução – da criação ao transporte.

Foram elaboradas atividades de consulta, pesquisa, entrevistas, fotografias e visitas, buscando material para compor o informativo.

Com a equipe de responsáveis pelas seções, selecionamos, para o primeiro número, os assuntos e os conteúdos sugeridos e enviados por diversos alunos.

Os alunos de todas as turmas, professores, pais e colaboradores se envolveram ativamente na confecção do informativo.

Desde então os informativos são distribuídos gratuitamente a toda a comunidade e, para cada um dos 20 patrocinadores, são enviados 100 exemplares para distribuição a clientes, amigos e funcionários.

Saiba mais

O trabalho possibilita a abordagem de diversos gêneros textuais. sendo a "Biografia" o mais evidente. A escolha desse gênero como objeto de ensino pode ser uma importante oportunidade de estudo.

Além disso, o projeto dá margem à entrada de diversos outros gêneros multimodais, como "Panfleto" e "Documentário", que podem ser inseridos como variações dos produtos de divulgação, de acordo com as diferentes realidades das escolas.