"A dinâmica social contemporânea nacional e internacional, marcada especialmente pelas rápidas transformações decorrentes do desenvolvimento tecnológico, impõe desafios ao Ensino Médio. Para atender às necessidades de formação geral, indispensáveis ao exercício da cidadania e à inserção no mundo do trabalho, e responder à diversidade de expectativas dos jovens quanto à sua formação, a escola que acolhe as juventudes tem de estar comprometida com a educação integral dos estudantes e com a construção de seu projeto de vida." (BNCC, 2018, p. 464)

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Nossa cultura tem som

Competência 1 | Competência 3 | Competência 5 | Competência 6
Área(s): Linguagens; Ciências Humanas e Sociais.

Desenvolvimento de projeto cultural visando à criação de grupo de ciranda e coco de roda (música e dança) para que os jovens não se esqueçam dos bens culturais produzidos pela cidade e respeitem as histórias e as tradições, reavivando nos alunos o sentimento de pertencimento à comunidade e de identidade cultural.

Quando: Em qualquer momento do ano letivo. Na experiência relatada, o projeto durou três meses.
Materiais:
  • celulares;
  • computadores;
  • microfones;
  • cabos de áudio;
  • DataShow;
  • caixa de som;
  • instrumentos de sopro;
  • instrumentos de percussão.
Competências específicas:
LGG – Competência 3; Competência 5; Competência 6; CHN – Competência 1
Habilidades trabalhadas: EM13CHS101; EM13CHS104; EM13LGG301; EM13LGG502; EM13LGG601; EM13LGG602; EM13LGG604.
Escola: Escola de Referência em Ensino Médio Alberto Augusto de Morais Pradines, Ilha de Itamaracá (PE).
Professor(a) responsável: Nielza Maria Lopes Santos.

O que é:

Formei com estudantes de diferentes idades, gêneros e etapas de escolaridade um grupo para desenvolver a leitura, a produção de cordéis, entrevistas e teoria e prática musical, além de noções de cidadania, ética, autovalorização e de apresentação em público.

Os estudantes estavam inseridos numa comunidade humilde, onde existem poucos empregos formais. O comércio, a construção civil e a pesca são os principais meios de sobrevivência.

Nosso trabalho teria de ser ainda mais ambicioso, avançando para a compreensão sobre a importância do respeito e da tolerância em relação à expressividade do outro.

Em projetos na escola, pude observar que muitos estudantes tinham vergonha e se recusavam a participar de manifestações culturais que envolvessem a ciranda e o coco de roda.

O mais desanimador era o fato de que a grande maioria deles não sabia as letras das canções e nem que em nosso município moravam mestras da cultura popular.

Foi necessária uma tomada de atitude para resgatar o valor da diversidade cultural local. Precisávamos esclarecer, por exemplo, por que a nossa comunidade era reconhecida no estado como a "Terra da Ciranda e do Coco de Roda", e o que esse título significava para as pessoas e para o turismo.

Tínhamos também a responsabilidade de entender o nível de conhecimento dos alunos sobre a história por trás de cada manifestação e o significado da diversidade cultural como fator de identificação e orgulho.

Nosso trabalho teria de ser ainda mais ambicioso, avançando para a compreensão sobre a importância do respeito e da tolerância em relação à expressividade do outro.

Por fim, eram nossas missões ainda conhecer a vida e a obra das mestras e compreender o papel da juventude na transmissão dos bens culturais às próximas gerações.

Expus o projeto à turma. Os alunos gostaram da proposta de formar um grupo cultural que homenageasse as mestras e aproximasse a ciranda e o coco de roda da comunidade escolar.

Precisei, então, realizar pesquisas interdisciplinares para garantir o aprendizado também nas áreas de História, Língua Portuguesa, Filosofia e Sociologia.

Fiz com que os estudantes enxergassem as possibilidades de expressão e de comunicação pela linguagem musical e corporal e seus benefícios para o equilíbrio físico e mental, a concentração e o desenvolvimento de habilidades e do bem-estar.

O processo de formação dos grupos de dança e música superou muito as expectativas didáticas e contou com o envolvimento não só dos alunos, mas da comunidade toda. Numa segunda etapa, avançamos para uma abordagem sobre empreendedorismo e trabalho com cultura e turismo.

Como fazer:

Havia muito tempo que eu queria formar na escola um grupo cultural, só não sabia como fazer isso.

Tudo mudou quando a Gerência Regional de Educação (GRE) enviou para algumas escolas um projeto-piloto de inserção de uma disciplina eletiva no currículo.

Nós, professores, teríamos a liberdade de escolher qual área do conhecimento deveria ser abordada na nova disciplina. Dessa forma, nasceu a “Eletiva de Música em Toda pARTE”, idealizada por mim e formada, no início, por 30 alunos.

O fato de os estudantes pouco valorizarem a ciranda e do coco de roda e de terem quase nenhum conhecimento sobre as mestras culturais que residiam em nossa cidade foi a inspiração para que eu criasse o "Grupo Nossa Cultura Tem Som".

Apresentei o projeto e as estratégias para seu desenvolvimento, como a realização de viagens, visita às mestras e apresentação na escola.

Decidi formar três grupos: um de dança, um de canto e um para tocar instrumentos musicais. Todos os alunos poderiam circular pelos grupos à medida que fossem desenvolvendo suas habilidades.

De início, muitos disseram que não sabiam dançar, cantar ou tocar. Outros informaram que até sabiam cantar, mas não conheciam as músicas de ciranda e coco de roda. Alguns alunos contaram que suas religiões não permitiam que cantassem ou dançassem. Havia ainda estudantes que associavam essas danças e músicas à “macumba”.

Mudar essa visão, resgatar a nossa cultura e ter a cooperação de todos no desenvolvimento do projeto estavam entre os meus objetivos. Para alcançá-los, eu teria de inserir conteúdos histórico-sociais nos encontros.

A valorização da mulher no processo cultural também foi uma prioridade. Para tal, incluí três mestras no projeto: Lia, Totinha e Anjinha.

Realizei, assim, visitas às mestras para conhecê-las melhor. Os estudantes escutaram suas histórias e como a forma de vida delas havia influenciado as produções musicais. Também cantaram, tocaram e dançaram com elas.

Decidi formar três grupos: um de dança, um de canto e um para tocar instrumentos musicais. Todos os alunos poderiam circular pelos grupos à medida que fossem desenvolvendo suas habilidades.

Antes desses encontros, eu já havia realizado algumas aulas expositivas sobre cultura e a influência dos artistas culturais populares na história da comunidade. Nesses encontros, mostrei também a dificuldade de sobrevivência dessa arte. Indiquei ainda o papel que turismo municipal poderia ter no fortalecimento dessa forma de expressão. Também apresentei ao grupo algumas canções do repertório de cada uma das mestras.

Durante as aulas, todos tiveram a liberdade de apresentar suas habilidades artísticas, sem nenhuma avaliação prévia. Descobrimos uma aluna, por exemplo, que estava tentando tocar violino sozinha.

Aprender a batida da ciranda e do coco de roda foi prazeroso para todos, principalmente para aqueles que não conheciam o assunto.

Os que antes recusavam-se a participar por causa da religião, começaram a interagir nos ensaios das danças, influenciados, talvez, pela empolgação do restante do grupo. Com isso, perceberam que o valor cultural não depende de credo.

Realizei algumas aulas extraclasse fora do município, com a ajuda da Secretaria de Educação, que cedeu o transporte escolar para as viagens. Levei os alunos ao Museu do Cais do Sertão para que conhecessem a vida e a obra do mestre Luiz Gonzaga e o cotidiano do povo sertanejo. Também fomos ao Teatro de Santa Isabel para assistir a um concerto da Orquestra Sinfônica do Recife.

Além de ouvir músicas clássicas, a turma conheceu todos os instrumentos da orquestra. No Museu, os alunos aprenderam como tocar instrumentos musicais ligados aos ritmos do Nordeste, como sanfona, viola e triângulo. Visitamos ainda um Centro de Artesanato.

Minha missão era fazer com que os alunos deixassem para trás a concepção de que a arte produzida pelos artistas da cultura popular era rude, pobre ou inferior. Esse estereótipo apareceu quando tentamos pesquisar sobre as canções das mestras de nosso município. Não havia quase nada referente a elas na internet ou em livros.

Por isso, pedi a elas o envio de letras de música. Montamos o repertório e continuamos a ensaiar. Naquele momento, todos já participavam ativamente do projeto. Quando não estavam em horários de aula, os alunos ensaiavam.

Nossos convidados foram essenciais no processo de desenvolvimento teórico-musical. Mas tive problemas, como a falta de instrumentos. A escola só tinha um bombo, que estava quebrado. Mandei consertá-lo e consegui outros instrumentos emprestados

As famílias que não tinham acesso ao mundo tecnológico recebiam informações em suas visitas à escola ou em encontros comigo. Todos os pais diziam que seus filhos haviam melhorado muito no desenvolvimento cognitivo e social.

Outra questão preocupante era o figurino do grupo, pois seriam 27 estudantes para vestir. A escola não tinha dinheiro. Pedi uma contribuição financeira de cada aluno, mas também tive de contribuir.

Compramos chapéus de palha, tecido chita e aviamentos para que a costureira pudesse trabalhar. Gastamos mais um pouco com gasolina, já que tivemos de sair do município para comprar alguns itens.

Junto com a evolução do projeto veio também a divulgação pelo Facebook. Sempre havia mensagens de apoio aos estudantes e à escola.

As famílias que não tinham acesso ao mundo tecnológico recebiam informações em suas visitas à escola ou em encontros comigo. Todos os pais diziam que seus filhos haviam melhorado muito no desenvolvimento cognitivo e social. O apoio, a confiança e o estímulo familiar foram essenciais para a construção do conhecimento.

Aconteceu, então, algo muito interessante. Durante os encontros e ensaios, era comum termos outros estudantes entrando na sala de aula cantando, dançando e pedindo para participar dos ensaios.

Ao final de cada encontro, eu levava o grupo até o pátio para que todos pudessem cantar e dançar. O grupo havia contagiado toda a escola.

O ponto alto do projeto chegou em outubro de 2017, numa gincana voltada à apresentação dos trabalhos das diversas disciplinas eletivas. Foi a oportunidade para que o "Grupo Nossa Cultura Tem Som" fosse devidamente apresentado a toda a comunidade escolar. Convidei as mestras para que participassem da homenagem. Todas se sentiram muito lisonjeadas.

Acreditei que ali estava a finalização do projeto, depois de três longos meses (de agosto a outubro de 2017). Mas, como vivemos num mundo globalizado e informatizado, alguém filmou a apresentação do grupo e a postou no Facebook. O vídeo recebeu mais de 300 visualizações e muitas mensagens.

Na verdade, não era o fim, mas o começo de uma caminhada de descobertas e apresentações em diferentes palcos, no município e fora dele. Os estudantes se sentiram muito importantes e com a autoestima elevada. Os convites não pararam de aparecer.

O "Grupo Nossa Cultura Tem Som" cresceu além do esperado, saiu dos muros da escola e foi introduzido no seio da comunidade, que abraçou o projeto. Até o fim de janeiro de 2018, ele já havia se apresentado em diversos eventos.

Saiba mais

Para acompanhar o apoio teórico usado pela autora do projeto, o professor poderá fazer a leitura do livro “Letramento Literário: teoria e prática”, de Rildo Cosson, especialmente do capítulo “Sequências Didáticas para o Oral e a Escrita: apresentação de um procedimento”.

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